terça-feira, 8 de novembro de 2011

A Abordagem Retórico-lógica/ Retórico-gramatical
Difundida num espaço reprodutivista e descontextualizado de prática docente, a abordagem
retórico-lógica apresenta-se aliada a uma concepção de linguagem enquanto sistema imanente e
abstrato, cuja única preocupação é a correção e normatividade dos recursos lexicais e gramaticais
usados no texto. Busca-se compreender a produção do texto como um processo regulado por
normas regidas pela gramática da língua, resultando em atividades que desconsideram o sujeitoescritor,
a situação de escrita e o papel discursivo e social do texto.
Bonini (2000, p. 29) propõe que entendamos a perspectiva retórico-lógica como “um
método de ensino [cuja] correção [é] do professor que conhece a gramática e, portanto, [...]
corrigir equivale a conferir ao texto do aluno uma direção correta”. Percebe-se que,
concomitantemente, apresentam-se técnicas de ensino normativistas assim como a legitimação da
norma culta padrão. Além disso, nessa abordagem pedagógica, a manipulação de estruturas
básicas de tipos textuais desenvolve-se como objetivo geral, ou seja, as idéias de treinamento,
repetição e manipulação são as “técnicas” principais. Sobre essa questão, Bonini (idem, p. 29)
afirma que, “quanto às técnicas de ensino [...] estas estão a serviço, fundamentalmente, da
apropriação dos esquemas básicos de textos: a narração, a dissertação e a descrição. Por isso, a
técnica principal é a de desenvolver o texto dentro de um esquema textual abstrato [...]”.
Propõem-se produções descontextualizadas, sem qualquer atenção ao papel de aspectos
sociais do texto. Nessa abordagem, o objetivo recai a reprodução de categorias gramaticais e
macroestruturais do texto, além de uma ênfase nos discursos de base/seqüências tipológicas que o estruturam.
Em adição, é evidenciado o uso de textos literários como modelos de cópia, além da
desconsideração de qualquer outra manifestação textual cotidiana do aluno – “a finalidade única
da produção textual é o treinamento de estruturas [...]” (Bonini, 2000, p. 30).Ensino modular, fragmentado e prescritivista, o modelo retórico-lógico/ retórico-gramatical
acredita no ensino baseado na manipulação de regras sintáticas, reescrita de textos literários e
atividades escrita formais, sistemáticas, resultando na assimilação de técnicas e padrões
impositivos de produção de textos. Buzen (2006, p. 142) afirma que, “se acreditava [...] no
aprendizado pela exposição à boa linguagem e na existência de uma língua homogênea, ahistórica
e [...] não problemática. [...] enfatizava-se o produto final [...]”. Em adição, ao avaliar o
processo de ensino/aprendizagem da escrita sob a vertente retórico-gramatical, a escrita torna-se
monológica e apenas centrada nas operações lógico-sintáticas do texto. “São propostas de
produção de texto que solicitam aos alunos que escrevam uma redação sobre determinado tema,
sem um objetivo específico, sem preocupação sociointerativa”. A prática retórico-lógica exclui a
possibilidade de diálogo entre o escritor, o texto e a situação, descontextualizando a escrita e a
estagnando a esquemas mecânicos e autônomos de escolarização da produção de texto.
A Abordagem Textual/Lingüístico-textual

Com o advento da Lingüística Textual na década de 80, a teoria do texto passa a ser
desenvolvida como objeto central das pesquisas em Lingüística Aplicada da época. Teorias sobre
a construção da coerência e coesão textuais tornam-se o fulcro temático das diversas discussões.
Segundo Fávero e Koch (2005, p. 15-16), a preocupação está no “tratamento dos textos no
seu contexto pragmático: o âmbito da investigação se estende do texto ao contexto, entendido, em
geral, como conjunto de condições – externas ao texto – da produção, da recepção e da
interpretação do texto”. Percebe-se a relevância das condições extratextuais, embora ainda em
estudos superficiais.
O ensino/aprendizagem da produção do texto ainda está direcionado a relações
intratextuais, buscando apenas a apreensão de esquemas de coerência e coesão. Diferenças
conceituais são, em adição, exploradas, procurando explanar sobre a relação entre texto e frase,
entre mecanismos micro e macroestruturais e entre gramática normativa e gramática textual.
Leal (1988, p. 140) afirma que se procura, na abordagem textual de ensino de produção do texto, uma “aplicação [...] de princípios da gramática do texto e da perspectiva funcional da frase
para o estudo da sintaxe em língua portuguesa e para a análise de produção de textos”. Portanto,
os conceitos de textualização ou textualidade e dinamismo comunicativo passam a ser
fundamentais para a compreensão da prática docente e da aprendizagem da produção de textos.
Leal (1988, p. 145) propõe que, “quanto à produção escrita de textos, poderão ser exploradas as propriedades de textualidade –
coesão, coerência – para desenvolver formas de construção ainda não dominadas pelo estudante;
para explicar e corrigir falhas observadas nas redações. Por sua vez, a exploração da perspectiva
funcional e da noção de dinamismo comunicativo oferecerá elementos para o aprimoramento da
expressão escrita. O professor poderá localizar e identificar o tipo de falha e propor exercícios
para corrigi-la [...]”. Em divergência da abordagem retórico-lógica, a vertente textual objetivava explicar por
meio de teorias advindas da Lingüística Textual o processo de produção e leitura de textos.
Percebemos a pouca consideração sobre o papel do discurso e das condições sociais de produção,
distribuição e consumo de textos, já que o que se pretende é a desconstrução dos princípios de
coerência e coesão textuais e das competências textuais do sujeito-escritor.
A concepção de texto se desloca de um paradigma estrutural, objetivo e auto-suficiente,
característica da abordagem retórico-lógica, para ser apresentada a partir do conceito de unidade
de significação global. Siqueira (1988, p. 167) postula que, o “texto é visto como uma unidade de
significação, ou seja, uma manifestação enunciativa com uma referência e uma tematização
organizada bilateralmente pela coerência e pela coesão”. Além disso, Koch (2005, p. 26) defende o ponto de vista de que, “a produção textual é uma atividade verbal, a serviço de fins sociais e, portanto, inserida em contextos mais complexos de atividades [...]; é uma atividade interacional, visto que os interactantes, de maneiras diversas, se acham envolvidos na atividade de produção textual”. Percebemos, portanto, as implicações e pressupostos dos estados das operações lingüísticas e contextuais no ensino/aprendizagem da produção de textos sob a perspectiva da Lingüística Textual.
A Abordagem Cognitiva/Psicolingüística.

A Psicolingüística apresenta-se como uma área interdisciplinar que busca compreender os
processos psíquicos de processamento da linguagem. Sob essa perspectiva, a vertente cognitiva
de ensino/aprendizagem de produção de texto objetiva compreender como processos
neurofuncionais e psicolingüísticos influenciam a aquisição da escrita. Dahlet (1994, p. 80)
afirma que, nessa abordagem, buscamos “[tratar] de empreendimentos com enfoques teóricos e
objetivos diferentes: [por exemplo] os da psicologia cognitiva, delimitando a organização e as
condições de mobilização ou de gestão dos conhecimentos requeridos para a produção da própria
escrita [...]”. Procura-se, de fato, identificar e explicar as capacidades mentais relativas à escritura
por meio de diferentes etapas de planejamento, revisão e reescritura dos textos. Sob essa perspectiva cognitiva, a produção textual preocupa-se não mais apenas com o
produto, isto é, com o texto pronto e à espera de correção, mas com o processo de escritura, visto
como dinâmico, consciente e psíquico. A avaliação processual integra a desconsideração de
julgamentos pré-estabelecidos e passa a aceitar as diversas etapas de escritura do texto, na qual os
erros são partes integrantes.
Bonini (2000, p. 32) argumenta que “as estratégias e os processos, detectados em pesquisas
experimentais, passam a servir como técnicas de ensino [...]; é marcante a preocupação com os
processos de planejamento e revisão do texto, pois são os momentos mais propícios para a
intervenção didática”. Diferentemente das abordagens retórico-gramatical e textual, o
ensino/aprendizagem do texto não mais se detém a apenas recursos lexicais e fraseológicos em
relação no sistema intratextual, mas começa-se a se preocupar com a produção enquanto processo psicológico e social (ainda que com pouca relevância). Dahlet (1994) propõe o ensino/aprendizagem de escrita a partir do encadeamento de operações psicolingüísticas e de elaboração didática que pode ser sintetizado em (1) processos de operação de produção da escrita: (a) a planificação, cujo objetivo é poder articular no plano da escritura o conhecimento, a situação e a forma; (b) a textualização que busca selecionar escolhas de designações e escolhas de construções sintáticas por meio de operações enunciativas e (c) a revisão, etapa na qual se retorna criticamente ao texto; (2) programação didática: (a) a verbalização de condutas, isto é, “uma descrição de atividades ordenadas no tempo que o sujeito assume ao realizar uma tarefa” (p. 83); (b) o levantamento das dificuldades de redação a partir do grau de planificação e de textualização; (c) a elaboração de procedimentos facilitadores, buscando conciliar “a iversificação da escrita com a atividade interna de um sujeito, construindo interações com outrem” (p. 85). Haja vista as diferentes perspectivas teórico-metodológicas do ensino/aprendizagem de produção textual, direcionemos nossa discussão para o advento de pesquisas em Lingüística Aplicada para o ensino/aprendizagem da linguagem sob a ótica dos gêneros do discurso.
A abordagem da Produção Escrita enquanto Prática Social

Ações sociolingüísticas são reguladas por nossas interações em diferentes e determinadas
esferas sociais. Práticas sociais por meio da linguagem não apenas se regularizam nas interações
interpessoais em espaços sociais como também legitimam esses espaços; a relação entre
sociedade e linguagem é dialógica. Nas interações, as diferentes ações por meio da linguagem são
tipificadas, isto é, sofrem determinadas estabilizações, que padronizam relativamente não apenas
nossos recursos lexicais, gramaticais e multimodais como a situação em sentido global. Essas
ações sociais e lingüísticas padronizadas e tipificadas na interação são denominadas gêneros do
discurso.
Pesquisas contemporâneas em Lingüística Aplicada têm contribuído para a compreensão do
funcionamento e plasticidade de gêneros em nossa vida social (Bazerman et al., 2005; 2006;
Marcuschi, 2002; 2005; Meurer e Motta-Roth, 2002; Motta-Roth, 2005; 2006; Rodrigues, 2005;Signorini, 2006).
Discussões sobre a incorporação dos gêneros na esfera escolar,metodologias de análise
de gêneros e a relação de gêneros e discurso têm apresentado contribuições para seu
entendimento e didatização. Bazerman et al. (2005, p. 143) propõe que, “os gêneros, como também outras distinções sociais que estão incorporadas em nossas ações,
percepções ou vocabulário de reflexão e planejamento, ajudam a dar forma à ação emergente
dentro de situações específicas. À medida que, em séculos recentes, o mundo social tem se
tornado cada vez mais diferenciado, muitas atividades são realizadas em diferentes tipos de
situações sociais, tornando as atividades discursivas cada vez mais diferenciadas”Concorda-se com Bazerman (idem) quanto à plasticidade e funcionalidade dos gêneros nas
esferas sociais. Os gêneros são flexíveis, dinâmicos e transmutáveis, direcionando sua
constituição às diferentes interações das quais faz parte. A tipificação dessas interações resulta
em enunciados estabilizados das quais se materializam em gêneros. Dessa forma, a regularização
da organização da comunicação interacional por meio de enunciados típicos em contextos e
esferas sociais determinados, resulta na perpetuação e legitimação dos gêneros nas interações por meio da linguagem.
Bakhtin (2000, p. 279) afirma que, “todas as esferas da atividade humana, por mais variadas
que sejam, estão sempre relacionadas com a utilização da língua [...], mas cada esfera da
utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados [...] que
denominamos gêneros do discurso”. O autor propõe que entendamos a relação entre esfera social
e linguagem, buscando nessa interdependência a construção, funcionalidade e dinâmica dos
gêneros. Cabe ressaltar sua preocupação na categoria de transmutação, intercalação e plasticidade dos gêneros, que se transformam, se justapõem e evoluem ao longo de sua historicidade em consonância às interações. Segundo Bakhtin (idem, p. 279), “[...] cada esfera [da] atividade [social humana] comporta um repertório de gêneros do discurso que vai diferenciando-se e ampliando-se à medida que a própria esfera se desenvolve e fica mais complexa”. O ensino/aprendizagem de produção textual em inter-relação aos gêneros do discurso requer que possamos compreender a dimensão texto enquanto dimensão do enunciado,
procurando evidenciar como a produção textual está de acordo com nossa representação do real,
de nosso contexto social e dos diversos objetivos a serem alcançados por meio da interação
escrita. As práticas de ensino pressupostas nessa vertente pedagógica são contextualizadas,
situadas (Kleiman, 2006), compreendidas como atividades sociais (Motta-Roth, 2006) e
catalisadoras (Signorini, 2006), já que favorecem a realização de ações produtivas para a
compreensão da língua(gem) enquanto prática social: (a) atenção para o processo de escrita
enquanto interação; (b) discussão e consciência das condições sociais de produção da escrita e (c)
relação da escrita com o gênero.Considerar os gêneros como objeto de estudo no ensino/aprendizagem da escrita pressupõe que concebemos a escrita enquanto agência, ou seja, prática social mediada pela linguagem que inscreve sujeitos em diferentes contextos de interação que se tipificam conforme a própria situação (imediata e cultural), a esfera social e de acordo com os objetivos a serem alcançados pelos interlocutores envolvidos. A escrita se realiza por meio de diversos gêneros que se configuram a partir da interação que fazem parte e da esfera social da qual se integram. Segundo Bazerman (2006, p. 10), “[a concepção de gênero enquanto agência está] além do gênero enquanto construto formal, para vê-lo como ação tipificada pela qual podemos tornar nossas intenções e sentidos inteligíveis para outros. Como resultado, o gênero dá forma a nossas ações e intenções”.
O estudo dos gêneros do discurso leva-nos a compreender a relação entre enunciado e
interação, já que a comunicação que se dá em diferentes esferas sociais, ocorre por meio de
enunciados concretos, sejam orais ou escritos. Vejamos, portanto, as diversas questões relativas à
compreensão do gênero sob a dimensão dialógica da linguagem com o intuito de entendermos
melhor o ensino/aprendizagem de produção textual sob essa vertente. Em adição, retomar-se –ão
as discussões propostas por Antunes (2006), Bazerman (2005; 2006), Buzen (2006), Marcuschi
(2002; 2005) e Motta-Roth (2006) sobre o ensino/aprendizagem da escrita como prática social

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